Querido pai, não sei como poderia eu escrever tudo o que sinto. As palavras limitam-se a escapar-me.
Já faz algum tempo desde que tiveste aquele acidente vascular cerebral…e eu anseio que melhores, a cada segundo da minha vida.
Custa-me tanto, não poder sentir aquela ligação emocional que tinhas comigo ou com a minha irmã. Limitas-te a sobreviver…porque certamente a tua vida desapareceu naquele dia. Nada recordas da minha juventude…e nada poderias recordar do meu futuro.
Custa-me ver a tua capacidade de sorrir, sem saber bem o porque… sorris para me tentares mostrar que continuas ai algures, talvez.
Lembro-me tudo o que passamos juntos, todos os bons momentos, todos os maus momentos, todas as discussões estúpidas que tínhamos.
Acredita que muito do que sou hoje deve-se ao simples facto de sempre ter lutado pela tua sobrevivência.
Agora vejo que não me cabe mais a mim lutar…e uma luta que tens de ser tu a travar.
Sinto-me fraco, porque sei que eu tenho a capacidade de mover os braços, as pernas. Sei que quando acordar serei capaz de ir a casa de banho sozinho, tomar banho, sair a rua sem me perder no caminho.
Entristece-me seres tu a estar nesse lugar, um lugar a que eu não tenho acesso e que os movimentos físicos se negam simplesmente a chegar-se perto de ti.
Só queria ter um dia, seria pedir muito? Um dia livre desta pedra entre nos…um dia em que pudéssemos ser realmente um “Nos”.
Apesar de nunca teres tido muita responsabilidade e influencia na minha vida, em termos de educação…quero que saibas que sou apenas tão forte quando aquilo que me tornaste.
Deixa-me chegar perto de ti, deixa-me ver-te por favor…por detrás dessa cortina que trazes no olhar…por detrás desse branco…
Sei que estas algures ai ainda, que possivelmente nunca iras ler esta carta…
Mas eu não preciso que lesses…eu precisava que sentisses…que vim, para ficar contigo e enfrentar o mundo.Amo-te mesmo...por favor, acredita e que isso te traga força para superares tudo o que nos distancia.
Feliz dia do pai
Nando
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